Acompanho sempre as análises do Prof. Sírio Possenti em sua coluna no portal Terra. O texto de hoje - 21.10 - é muito interessante. Atentem para a pequena nota!!!!
Palavras entram no mercado lingüístico por razões diversas. Dou dois exemplos.
Palavras entram no mercado lingüístico por razões diversas. Dou dois exemplos.
Nas últimas semanas, especialmente a propósito da situação dos mineiros chilenos que finalmente foram resgatados, falou-se muito em "socorrista", que dicionários registram, mas cujo emprego era absolutamente raro (eu nunca tinha ouvido). No dia 16/10/2010, ouvi também "resgatista". O jornal falava de um desmoronamento em mina chinesa. Por algum tempo, desastres assim estarão na moda, acho. Como alguns bispos e pastores que logo desparecerão da mídia.
O Houaiss registra "socorrista", mas não "resgatista". Mas é fácil ver que se trata da aplicação da mesma regra derivacional: acrescenta-se o sufixo -ista a "socorro" ou a "resgate". Em ambos os casos, a vogal temática "cai" (-o em "socorro", -e em "resgate").
Procurei -ista no mesmo dicionário, já que uma de suas características é fornecer diversas informações sobre os sufixos muito produtivos. Manda ver -ismo, o que equivale a dizer que palavras em -ista têm um sentido associado à palavra correspondente em -ismo (getulismo, getulista; socorrismo, socorrista). O dicionário fornece diversos sentidos de -ismo e, claro, de -ista: em getulista, -ista significa adepto, simpatizante, seguidor; em socorrista, o agente (do socorro).
Outras palavras entram no mercado por razões diferentes. Não acompanham acontecimentos midiáticos, sensacionais. Trata-se ainda de acontecimentos, mas de outra natureza. Um bom exemplo é a palavra "empregabilidade".
Um dos aspectos que chamam atenção é que sua "derivação" é regular: destaquem-se as regras que foram produtivas diacronicamente (mudança de v > b e de e > i): empregável > empregabilidade (como em amável > amabilidade e centenas de outras palavras) e que continuam produtivas sincronicamente.
Outros aspectos importantes são sua circulação e seu sentido ideológico. Mais ou menos em meados nos anos 90, a palavra, então de uso raro, passou a ser freqüente em jornais, na pena ou na boca dos próprios jornalistas (que repetiam um discurso que começava a sem impor) ou na de autoridades e especialistas em questões de trabalho. Mesmo uma análise simples mostra que houve uma mudança política de foco: em vez de falar de "emprego" / "desemprego", passou-se a falar de "empregabilidade" / "não empregabilidade" (que eu saiba, ninguém falou em "desempregabilidade"...).
O que explicava esta mudança, e a consequente "popularização" da palavra? Com novas tecnologias nas fábricas (robôs) e em outros estabelecimentos (caixas automáticos, computadores) e com o advento de novas formas de trabalho (mais serviços do que indústrias), passou-se a exigir maior capacitação individual do trabalhador.
Ou seja, para certa posição política / ideológica, a questão deixava de ser se as fábricas empregavam mais ou menos trabalhadores e passou a ser se os trabalhadores tinham ou não qualificação para ocupar os "novos" postos de trabalho. Ou seja, a questão passou a ser se eles eram empregáveis, se tinham esse predicado. Em épocas de recessão, é fácil perceber que isso significava também "culpar" o cidadão em vez de culpar o sistema "produtivo", como se fazia antes, pelo desemprego.
Chama atenção o fato de que houve um enorme crescimento de circulação da palavra (circulação que claramente diminuiu nos últimos anos). Ocupação um espaço especial nos debates ideológicos, que também não ocupa mais. De certa forma, a palavra condensou um conjunto de discursos e de práticas de uma época: sua análise em contexto histórico explica que tenha havido tantos cursos de "capacitação", por exemplo, especialmente de desempregados, para que eles se tornassem capazes de disputar outros empregos ou de organizar seus próprios negócios.
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FHC, em discurso recente: "Lula fez coisas boas, que reconheço. Agiu bem na crise financeira. Para que, meu Deus, então ser tão mesquinho? É isso que eu quero perguntar para ele. Por que isso, rapaz?".
Lembrei o evento em que o deputado Joe Wilson, que gritou "you lie, boy", enquanto Obama discursava.
Grave não é discordar ou chamar não importa quem para uma conversa. Sintomáticas são as expressões: "boy" lá, "rapaz", aqui. Coisas da Casa-grande aqui, coisa de branco lá.
Disponível em: http://terramagazine.terra.com.br/. Acesso em: 21.10.2010
FHC, em discurso recente: "Lula fez coisas boas, que reconheço. Agiu bem na crise financeira. Para que, meu Deus, então ser tão mesquinho? É isso que eu quero perguntar para ele. Por que isso, rapaz?".
Lembrei o evento em que o deputado Joe Wilson, que gritou "you lie, boy", enquanto Obama discursava.
Grave não é discordar ou chamar não importa quem para uma conversa. Sintomáticas são as expressões: "boy" lá, "rapaz", aqui. Coisas da Casa-grande aqui, coisa de branco lá.
Disponível em: http://terramagazine.terra.com.br/. Acesso em: 21.10.2010
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